sábado, 11 de junho de 2011

Interpretar não é importante, é essencial!!

 Tenho percebido que nos vestibulares o que mais tem prejudicado os vestibulandos não é o grau de dificuldade do conteúdo, mas sim a interpretação, vemos, por exemplo no próprio ENEM que o que mais é exigido é a interpretação,..sim, os alunos não entendem o que lê, e muitos não chegam sequer a ler o enunciado para saber o que se pede. Mas agora, qual é a importância de uma boa interpretação? Bom, eu te respondo com um famoso conto de Carlos Drummond de Andrade..



                                             Assalto

Na feira, a gorda senhora protestou a altos brados contra o preço do chuchu:
-Isto é um assalto!
Houve um rebuliço. Os que estabam perto fugiram. Alguém, correndo, foi chamar a guarda. Um minuto depois, a rua inteira, atravancada, mas provida de admirável serviço de comunicaçäo espontânea, sabia que se estava perpetando um assalto ao banco. Mas que banco? Havia banco naquela rua?Evidente que sim, pois do contrário como poderia ser assaltado?
-Um assalto! Um assalto!- a senhora continuava a exclamar, e quem näo tinha escutado, escutou, multiplicando a notícia. Aquela voz surgindo do mar de barracas e legumes era como apropria sirena policial, documentando, por seu uivo, a ocorrência grave, que fatalmente se estaria consumando ali, na claridade do dia, sem que ninguém pudesse evitá-la.
Moleques de carrinho corrian em todas direçoës, atropelando-se uns aos outros. Queriam salvar as mercadorias que transportavam. Näo era o instinto de propriedade que os impelia. Sentiam-se responsáveis pelo transporte. E no atropelo da fuga, pacotes rasgavam-se, melancias rolavam, tomates esborachavam-se no asfalto. Se a fruta cai no chäo, já näo é de ninguém; é de qualquer um, inclusive do transportador. Em ocasiöes de assalto, quem é vai reclamar uma penca de bananas meio amassadas?
-Olha o assalto! Tem um assalto ali adiante!
O ônibus na rua transversal parou para assuntar. Passageiros ergueram-se, puseram o nariz para fora. Näo se via nada. O motorista desceu, desceu o cobrador, um passageiro advertiu:
-No que você vai a fim de ver assalto, eles assaltam sua caixa.
Ele nem escutou. Entäo os passageiros também acharam de bom alvitre abandonar o veículo, na ânsia de saber, que vem movendo o homen, desde a idade da pedra até a idade do módulo lunar.
Outros ônibus pararam, a rua entupiu.
- Melhor. Todas as ruas estavam bloqueadas. Assim eles náo podem dar no pé.
- É uma mulher que chefia o bando!
- Já sei. A tal dondoca loura.
- A loura assalta em Säo Paulo. Aquí é a morena.
- Uma gorda. Está de metralhadora. Eu vi.
- Minha Nossa Senhora, o mundo está virado!
- Vai ver que está caçando é marido.
- Näo brinca numa hora dessas. Olha aí sangue escorrendo!
- Sangue nada, tomate.
Na confusáo, circularam notícias diversas. O assalto fora a uma joalheria, as vitrines tinham sido esmigalhadas a bala. E havia jóias pelo chäo, braceletes, relógios. O que os bandidos näo levaram, na pressa, era agora objeto de saque popular. Morreram no mínimo duas pessoas, e três estavam gravemente feridas.barracas derrubadas assinalavam o ímpeto da convulsäo coletiva. Era preciso abrir caminho a todo custo. No rumo de assalto, para ver, e no rumo contrário, para escapar. Os grupos divergentes chocavam-se, e às vezes mudavam de direçäo: quem fugia dava marcha à ré, quem queria espiar era arrastrado pela massa oposta. Os edificios de apartamentos tinham fechado suas portas, logo que o primeiro foi invadido por pessoas que pretendiam, ao mesmo tempo, salvar o pêlo e contemplar lá de cima. Janelas e balcöes apinhados de moradores, que gritavam:
- Pega! Pega! Correu para lá!
- Olha ele ali!
- Eles entraram na kombi ali adiante!
- É um masacarado! Náo, säo dois mascarados!
Ouviu-se nitidamente o pipocar de uma metralhadora, a pequena distância. Foi um deitar-no-chäo geral, e como näo havia espaço, uns caíam por cima dos outros. Cessou o ruído. Voltou. Que assalto era esse, dilatado no tempo, repetido, confuso?
- Olha o diabo daquele escurinho tocando matraca! E a gente com dor-de-barriga, pensando que era metralhadora!Cairam em cima do garoto, que desapareceu na multidäo. A senhora gorda apareceu, muito vermelha, protestando sempre:
- É um assalto! Chuchu por aquele preço é um verdadeiro assalto!

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